
Barueri, em São Paulo (Foto: Divulgação)
Manaus (AM) – Desde que deixou o emprego e o filho de apenas cinco anos em Manaus, a paraense Leumara B. Mendes, de 22 anos, passou por momentos de desespero. Ela se aventurou em São Paulo para encontrar Ryan Matheus das C. S. Freire, de 24 anos, com quem havia começado um relacionamento por meio das redes sociais. O que deveria ser o começo de uma nova vida resultou em agressões, controle psicológico e um pedido urgente de ajuda. Na madrugada de quinta-feira (21), a Guarda Civil de Barueri resgatou a jovem após os parentes denunciarem o caso em Manaus.
O portal Diário Manauara acompanhou, com exclusividade, toda a operação que permitiu o resgate. Por motivos de segurança e para proteger a dignidade de Leumara e a integridade da investigação, esta reportagem decide não mostrar as imagens da vítima nem do suspeito, mesmo que estejam presentes nos documentos oficiais. A história de Leumara serve como um alerta sobre os perigos de relacionamentos que começam pela internet, fazendo referência a casos previamente divulgados pelo portal com desfecho triste.
Um exemplo é o de Clisia Lima da Silva, uma amazonense de 35 anos natural de Manacapuru (AM), que foi assassinada no interior paulista após se mudar para viver com um homem que conheceu online. Seu corpo foi descoberto em 30 de outubro de 2024, nas águas de uma represa localizada na rodovia José Augusto Freire, perto do bairro Barrocão, em Piracaia. O suspeito do crime foi preso horas depois.
Da promessa de romance ao ciclo de violência
Leumara, natural de Faro, no oeste do Pará, conheceu Ryan Matheus por meio do Instagram, plataforma em que o jovem compartilhava vídeos de treinos e um estilo estético que despertou seu interesse. Impulsionada pela expectativa de um relacionamento promissor, optou por deixar tudo para trás e se mudar para São Paulo, especificamente para Barueri.
O depoimento de Leumara foi acessado pela reportagem. De acordo com o Boletim de Ocorrência registrado na Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) de Barueri, o tormento teve início no segundo dia de convivência. A vítima afirma que Ryan Matheus a agrediu fisicamente, tomou seu celular, apagou contatos de familiares, controlou conversas e começou a ameaçá-la com vídeos íntimos que ambos gravaram.
Partes do Boletim de Ocorrência indicam que Leumara estava sempre sob vigilância, até mesmo durante chamadas de vídeo com sua mãe, Greice Barbosa, que percebeu que a filha não podia se expressar livremente. Quando Ryan Matheus saiu de casa para ir ao trabalho, Leumara recordou-se do número da mãe e conseguiu enviar uma mensagem angustiada, informando que estava sendo agredida e temia por sua vida.
Família aciona autoridades em Manaus e São Paulo
Com base na mensagem, Greice Barbosa solicitou auxílio à sua filha mais nova, Maria Heloisa, residente na Zona Leste de Manaus. Sob a orientação do delegado plantonista Rodrigo Leão, da Delegacia Especializada em Homicídios e Sequestros (DEHS), a irmã fez um registro de ocorrência detalhando o perigo iminente.
Com base nisso, a família acionou a Polícia Civil de São Paulo para encontrar e salvar a jovem. Ao tomar do conhecimento, o delegado Luiz Carlos Ziliotti, de Piracaia, mobilizou equipes da Guarda Civil em Barueri e, após rastrear o endereço fornecido, localizaram Leumara, que foi resgatada do local durante a madrugada.
No Boletim de Ocorrência (B.O.), a vítima relatou que Ryan Matheus a agrediu fisicamente, a ameaçou e a submeteu a violência psicológica, além de controlar suas saídas e conversas. Esses comportamentos configuram uma violação da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006).
A volta para casa
A mãe adquiriu uma passagem aérea, e a jovem foi levada até o Aeroporto de Guarulhos, de onde partiu rumo a Manaus. Nesse destino, ela encontrará novamente o filho de cinco anos, além da irmã e outros familiares.
“Eu só pensava no meu bebê. Eu precisava sair dali para voltar para ele. Agora eu só quero recomeçar”, disse, emocionada, à equipe do Diário Manauara minutos antes de entrar na sala de embarque.
Ao Diário Manauara, Leumara afirmou que ainda está “abalada, mas aliviada por estar viva”. A vítima relata que o acusado eliminou todos os contatos de sua agenda telefônica, limitou sua liberdade de movimento e começou a vigiar suas conversas.
“Ele dizia que, se eu tentasse fugir ou contar algo, ia postar nossos vídeos íntimos. Eu fiquei em choque, com medo de morrer ali mesmo”, disse Leumara em áudio enviado à reportagem antes do embarque para Manaus.
Leumara também afirmou que os parentes notaram comportamentos estranhos durante as videochamadas, que eram sempre feitas com Ryan Matheus presente, observando o que ela falava.
“Ele ficava o tempo todo olhando para mim, mandando eu responder rápido e sorrir. Eu tinha que fingir que estava tudo bem”, relatou.
A oportunidade para pedir socorro
Somente quando Ryan Matheus saiu de casa por algumas horas, Leumara conseguiu recordar o número da mãe e enviar mensagens angustiadas.
“Mãe, ele vai me matar. Me ajuda, por favor. Eu não sei como sair daqui”, escreveu a jovem em um dos trechos obtidos pela reportagem.
O Resgate
Greice Barreto recebeu a chamada que alterou o curso dos acontecimentos durante a madrugada:
“Mãe, eu estou bem. Eles me encontraram. Eu estou livre.”
Leumara foi resgatada por equipes da Guarda Civil de Barueri, que a retiraram do local onde vivia sob vigilância e violência doméstica. A jovem foi levada para prestar depoimento e submetida a um exame de corpo de delito no Instituto Médico Legal (IML). Ela foi recebeu assistência para voltar à capital amazonense.
Alerta às mulheres sobre relacionamentos online
O incidente destaca a necessidade de cuidado em relacionamentos que começam online. Após se mudarem motivadas por promessas amorosas, mulheres têm sido vítimas de fraudes, exploração sexual, tráfico de pessoas e casos de violência doméstica em outros estados.
O delegado Luiz Carlos Ziliotti, da Polícia Civil deo Estado de São Paulo, conhecido por resolver casos semelhantes, alertou os casos ao Diário Manauara:
“Já conseguimos desvendar muitos crimes sentados numa mesa, apenas pesquisando. A internet revela mais do que as pessoas imaginam.”
Final feliz — mas alerta permanente
A rápida colaboração entre as Polícias Civis de São Paulo e Guarda Civil de Barueri evitou que o caso de Leumara terminasse de forma trágica. Agora, ao retornar para casa, ela iniciará sua reconstrução, rodeada pelo apoio da família.
Recado às mulheres
Se algo parecer errado, se houver medo, controle ou violência, faça uma denúncia. A vida sempre tem mais valor do que qualquer promessa de amor.
Análise legal do caso
O Boletim de Ocorrência, que o Diário Manauara teve acesso, documenta três delitos principais:
Lesão corporal qualificada – Art. 129, §13 do Código Penal (Quando praticada contra mulher, por razões da condição do sexo feminino, no âmbito doméstico).
Violência psicológica – Art. 147-B do Código Penal (Controlar, isolar, intimidar e ameaçar a vítima configura crime autônomo, adicionado ao Código Penal pela Lei Maria da Penha).
Violência doméstica – Lei 11.340/2006 (A conduta de Ryan Matheus se encaixa nos artigos que definem violência física, psicológica e moral).
Oitiva
No despacho policial, o delegado Rogério Pereira de Oliveira, da DDM Barueri, reconhece fortes indícios da prática dos crimes, embora não tenha decretado flagrante por entender que o lapso temporal impedia essa medida. Ainda assim, determinou:
Pedido de medidas protetivas de urgência, Anexação de prints de conversas e fotos de lesões, Encaminhamento para exame de corpo de delito no IML, Prosseguimento das investigações, Resgate, acolhimento e retorno à vida








